quinta-feira, 18 de julho de 2013

O jardim aqui de casa



As flores do jardim aqui de casa congelaram, meu sorriso também. O mundo ficou cinza, e o sol quase não aparece mais, as vezes algumas nuvens cor de rosa dizem olá depois da chuva no final da tarde, mas é só.
Os pássaros se foram, as folhas mortas sob o pé do sobreiro permaneceram. A casa está silenciosa, os corredores vazios, exceto pelo espelho antigo que as vezes reflete uma imagem antiga.
Mas eu estou aqui, deitada na grama gelada, pensando no que poderia ter dito e feito. Os lugares onde morei sempre deixaram marcas em mim, aqui não será diferente. Um pedaço meu ficará em cada parede branca, no reflexo de cada janela velha.
Sentirei falta do meu jardim, que nunca foi meu realmente, nunca cuidei dele. Sentirei falta das flores e da grama sob meus pés.    

terça-feira, 9 de julho de 2013

Apenas domingo

   Novamente o dia havia nascido frio e nublado, e nublado estava dentro dele também. 
   Os cigarros haviam acabado, mas ainda era tão cedo para abandonar o calor do seu quarto. Há tempos ele estava tentando parar, mas parecia que aquela fumaça esbranquiçada saindo de dentro de si era parte dele agora. Bom, ele tentará, mas chicletes eram tão sem graça, perdiam o gosto rápido, e ele gostava de coisas que durassem, não que um cigarro durasse muito tempo. 
   Garrafas de vinho acumulavam-se perto da cama, e havia algumas no banheiro também. Este não era um vicio significativo, nem chegava perto de ser, mas nas noites frias de inverno a companhia de um vinho barato caia bem. 
   Ele olhou para o relógio, não soube que dia era, talvez domingo? Não havia muito barulho lá fora, estava calmo, e isso o fez levantar, caminhar por ruas calmas, sem todos aqueles carros e pessoas andando apressadas poderia ser bom. 
   Jogou as cobertas pro lado e encarou o poster da Marilyn Monroe na parede ao lado da janela. Desejou poder encontrar uma Marilyn para si algum dia, não era necessário um vestido branco esvoaçante, não com aquele frio todo, nem cabelos loiros ou uma pinta perto da boca. Apenas alguém, que sorrisse para ele de manhã. O poster da Marilyn sempre sorria, se contentaria com isso então.
   Vestiu-se com roupas quentes e saiu porta afora, desceu rapidamente o lance de escadas e logo estava na rua. Realmente estava calmo, avistou alguém cruzar a esquina lá na frente, mas apenas isso.  
   Nenhum raio de sol para aquecer a alma, mas agradeceu por ao menos não estar chovendo. Sentiu-se infeliz e solitário, como todo dia sentia-se. Caminhou por um longo tempo. As casas estavam mortas, as lojas fechadas, deveria ser mesmo domingo. Ele precisava de um cigarro. 
   Olhou em volta e avistou um pequeno estabelecimento aberto. Atravessou a rua e entrou no local, estava mais quente do que lá fora e cheirava a café fresco. 
    - Posso ajudar? - Perguntou o senhor com cara de sono atrás do balcão.
    - Preciso de alguns cigarros. - Ele disse metendo a mão nos bolsos, atrás de algum dinheiro.
    - Não vendemos cigarros aqui.
    - Um café então? -  O homem acenou com a cabeça e entrou em uma porta. 
   As mesas estavam todas vazias, exceto por alguém com cabelos castanhos. Ele dirigiu-se para uma das mesas, sentou-se e esperou por seu café enquanto observava a garota de cabelos castanhos, ela lia algum livro e fumava um cigarro. Ele pensou em ir até lá dizer olá, mas ficou onde estava. 
   O homem apareceu com uma bandeja com duas xícaras cheias de café, foi até a mesa da garota e depois até a dele. O café estava realmente quente, um pouco forte, mas servia para mandar o sono embora. 
Após algum tempo ele percebeu que a garota o olhava desconfiada. 
    - Você quer um cigarro? - Ela perguntou subitamente de onde estava sentada. Ele sorriu. Sim, ele queria.
   -  Se não for fazer falta, eu aceito sim. - Ele respondeu. Nenhum dos dois levantou de onde estava, e então ela jogou o masso para ele, as mesas não era muito longe e como estavam um de frente para o outro não foi difícil conseguir pegar. Ele pegou um cigarro e jogou novamente para ela.
   - Obrigado. Eu realmente estava precisando. - Ele achou o isqueiro no bolso e acendeu o desejado cigarro.
    - Eu percebi. - Ela riu, seu dentes eram um pouco tortos, mas eram de um branco profundo. Um belo sorriso, ele pensou. - Desde que você entrou aqui não parou de olhar pra mim, implorando com os olhos por um trago. 
     - Talvez não fosse só pelo cigarro. - Ele respondeu e ela sorriu em silencio. Algum tempo passou, o café de ambos havia acabado e o silêncio prevaleceu. Não que ele fosse ruim, era até agradável.  A garota levantou-se, enrolou o cachecol no pescoço e colocou algum dinheiro na mesa, pronta para ir embora.
     -  Como é o seu nome? - Ele finalmente perguntou.
    - Audrey. - Ela respondeu, sem perguntar o dele. Ele apenas sorriu, ela acenou e então partiu. Ele, ao chegar em casa avistou o poster da Marilyn, ela sorria com aqueles cabelos loiros e decote exagerado. Estava cansado dela. 
    - Audrey. - Ele disse para sim mesmo. - É um nome bonito. - E então resolveu que Marilyn Monroe partiria no dia seguinte, talvez uma Audrey Hepburn ficasse mais bonita em sua parede. 
 

Pensamentos amassados


O trem estava demorando novamente, todas as manhãs eram iguais.
O sol começava a surgir por entres algumas nuvens mas o vento outonal insistia em lhe bater contra a face.
Nos pés os mesmos sapatos, marrons e sujos, o mesmo vestido azul desbotado, a mesma linha reta nos lábios e os pensamentos repletos de velhas lembranças e músicas antigas.
O grande relógio da estação estava parado havia tempos, marcando a mesma hora o tempo todo, talvez ela estivesse atrasada, mas ainda era tão cedo para tantas coisas.
Lá longe nos trilhos podia-se ver o trem em movimento, aproximando-se, envolvendo o mundo com fumaça, e então já era hora.
Ela levantou  tentou desamassar o melhor que pode as saias do vestido e quem dera poder desamassar seus pensamentos também e se foi, para mais um dia, para mais algumas horas, mais uma vida.